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Dois abortos e um diagnóstico de Pé Torto Congênito: a dor e o amor

Dois abortos e um diagnóstico de Pé Torto Congênito: a dor e o amor
AMANDA SANTOS RODRIGUES
mai. 25 - 8 min de leitura
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Meu nome é Amanda, tenho 40 anos e sou do interior de São Paulo.  

Meu relato aqui começa quando eu estava com 38 anos, casada há dois anos e decidi engravidar.  Após a interrupção do uso do anticoncepcional, a confirmação da gravidez veio rapidamente, e encheu nossos corações de alegria. Porém, no exame de rotina com 11 semanas de gestação, descobri que meu bebê tinha parado de evoluir na 7ª semana. Esse foi o primeiro baque da nossa trajetória. Como assim? Minha “Helena”? Tínhamos feito exame de sexagem fetal e estávamos certos de estarmos esperando nossa menina (muito ansiosa que sou, já comecei a comprar roupas, carrinho de bebê, penduricalhos)... e nada mais fazia sentido de um dia para outro? A dor foi enorme. Fiz a primeira curetagem. Meu aborto foi retido, não tive dor, sangramento, absolutamente NADA.

A dor era na alma, algo me rasgava por dentro, mas eu sabia que Deus estava me cuidando. Uma semana após a curetagem, numa nova consulta descobrimos que ainda havia restos ovulares dentro de mim e que eu precisaria fazer novamente a curetagem. E tudo aquilo veio à tona novamente. Quanta dor emocional...que luto! Mas eu nunca duvidei que a mão de Deus cuidava de mim.

Após o tempo de recuperação do útero, estávamos nós, em meio à pandemia, tentando novamente nossa gravidez e ela veio depois de dois meses e foi aquela mistura de sentimentos! Era uma felicidade com um medo enorme de passar por tudo aquilo de novo, mas fomos avançando. A meta era passar as “12 semanas críticas”, e na consulta com 9 semanas, novamente a notícia do médico: “o coração parou de bater”. Nessa ocasião, eu já tinha mudado de médico. Nãaaaao, eu não aceitava, como assim? Na semana anterior o senhor me disse que estava tudo bem, não pode ser. Mas era outro aborto retido, sem sintoma, sem dor, sem cólica, sem sangramento, novamente com a alma DESPEDAÇADA.

Caí num luto pesado, uma semana de cama, com celular desligado e falando para Deus: “não consigo conversar com o Senhor, embora saiba que estás cuidando de mim, mas não consigo conversar”.

Era pandemia, não tinha como ficar indo na casa da família, apesar de receber muito apoio, vivi isso dentro da minha casa, com meu marido me cuidando e Deus que, embora eu não estivesse conseguindo conversar, eu sabia que estava cuidando da minha ferida. Tudo de novo, curetagem, hospital, exame, com a diferença que nesta fase eu estava indo em um médico especialista em aborto por repetição, que afirmou: “Eu sei o que você tem, mas vamos fazer o exame para comprovar”. E assim comprovamos. Eu tinha TROMBOFILIA. Não sabia o que era, nunca tinha ouvido falar e fui me inteirar do assunto.

Trata-se de uma doença autoimune que impede a passagem de sangue da mãe para o feto a partir de um tempo da gestação, é necessário o uso de injeção diária para impedir a coagulação do sangue.

Opa, eu estava voltando a me animar! Agora sabendo o que eu tinha, não perderia novamente meu bebê. E assim foi, cinco meses após a curetagem, meu “positivo” chegou de novo!

Comecei imediatamente com o uso da injeção e o acompanhamento médico passou a ser semanal e tudo sempre caminhando bem, graças a Deus. Após as 12 semanas, as consultas passaram a ser mensais e tudo caminhando tranquilamente bem. Fizemos a ultrassom morfológica do 1º trimestre e tudo estava bem. As semanas passando e então começamos os preparativos para a nossa Nicole.

Eu havia doado TUDO o que comprei na primeira gestação, mesmo sabendo que eu tentaria engravidar de novo, mas meu propósito era poder ajudar outras pessoas de alguma forma, doamos o estoque de fraldas, roupas, tudo!.

Começamos a nos preparar para a chegada da nossa Nicole, nosso bebê arco-íris tão desejado e amado. Chegou o momento da ultrassom morfológica do 2º trimestre, então com 22 semanas de gravidez e junto a notícia: “Seu bebê tem Pé Torto Congênito bilateral”. Oi? Como? Do que você está falando? Não pode ser doutora. Meu primeiro exame estava tudo bem, refizemos o exame e mesma coisa, o mesmo diagnóstico.

Milhares de dúvidas e o medo começam a invadir nossa mente, mesmo que eu não quisesse. O que é Pé Torto Congênito? O que vou fazer? Como vou cuidar da minha bebê? Será que ela vai sofrer? E vinha choro, choro e mais choro... por um instante, e alguns dias, esqueci que meu próprio milagre era ELA, que aquele coração batendo dentro de mim era o maior presente de Deus depois de tanta dor e sofrimento pelas perdas.

Fiquei mal, sem saber o que fazer, pra quem perguntar, se contava pra família ou não.... mas Deus sabe de todas as coisas. Ele sabia que a minha “cegueira” era momentânea. Resolvi conhecer o assunto, busquei na internet, entrei nos grupos de gestantes, pesquisei, pesquisei e graças a uma mãe abençoada que deixou seu celular num aplicativo de acompanhamento da gravidez (Kizi, meu primeiro anjo), eu cheguei aos grupos de mães com crianças PTC.

A partir desse grupo as coisas foram mudando, fui conhecendo histórias de muita superação, quantas mães guerreiras, quantas mães dando um show de exemplo, mostrando que aquilo não era “nada” perto do tamanho do amor que elas têm para dar.  Ali também enxerguei Deus me mostrando que Ele não nos dá a cruz maior do que podemos carregar e que junto com qualquer obstáculo, vem a mão Dele, que é muito maior e dá a força necessária para o que tiver que ser encarado.

Pedi perdão por “não aceitar” a deficiência da minha filha. Eu nunca a rejeitei, desde que descobri o PTC, mas passei por dias difíceis da não aceitação. Com as lágrimas escorrendo pela tristeza eu sempre falei para ela: “Filha, a mãe vai fazer o que TIVER que fazer por você, não liga para esse choro, é que a mãe está triste, mas vai passar”. Afinal, todas a mães sonham com seus filhos perfeitos, nada diferente disso. E sentir tudo aquilo que senti era normal.

Desde então, Deus vem me dando os caminhos, conheci tudo o que precisava saber sobre o método Ponseti, fui ao especialista me consultar, já mapeei locais, datas e tudo o que eu preciso saber para quando meu bebê chegar... e sabem como estou agora? Amando-a mais do que nunca, ansiosa pela chegada dela para darmos todo o amor que temos dentro de nós, trabalhando o que precisa ser trabalhado para estarmos preparados emocionalmente para o que vamos enfrentar (preconceitos, olhares, comentários infelizes), mas com a certeza de que nosso amor será maior do que as dores que passaremos, e enxergando que Deus dá as maiores batalhas para os maiores guerreiros. Ouvi isso de duas pessoas.

Agradeço a todas a mães que compartilham suas histórias. Vocês são espelhos para mim e para muitas outras mães. Contarei minha história toda, a Nicole conhecerá e contará a história toda dela. E faremos isso com a cabeça erguida, segurando nas mãos de Deus.


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